domingo, 5 de junho de 2011

BAGÉ Terra de guerreiros

Cidade gaúcha sempre teve nos conflitos a sua grande marca histórica

Se há uma terra onde nunca faltou ocupação para cabra macho, esta é Bagé, na fronteira do Rio Grande do Sul com o Uruguai.
'Peleando' contra os espanhóis, ao lado do imperador, ou apoiando os republicanos, contra o mesmo imperador, os bageenses ainda encontraram tempo até para marchar e ameaçar invadir a Banda Oriental do Uruguai, além de proclamar a República Rio-Grandense. Assim, entre 1773 e 1893, viveram com a garrucha a tiracolo.
Mas Bagé não é boa só de guerra. Está repleta de belezas naturais, ainda pouco exploradas pelo turista. Porta de entrada para o pampa gaúcho, seus campos preservam o bioma natural da região e seu povo não se cansa de mencionar a sua rica arquitetura urbana e rural. Como o gaúcho de fronteira jamais viveu sem um cavalo, só poderia ser por aquelas terras que se encontra o que há de melhor na produção eqüina nacional, principalmente dos puros-sangues ingleses e dos crioulos. E não fica só nisso. Há muito artesanato no Caminho Farroupilha e na Costa Doce, mostrando a carteira de identidade cultural de uma área que serviu de cenário para refregas político-militares, numa rota que liga Bagé a cidades como Caçapava do Sul, Santana do Livramento, Piratini, e Camaquã, entre outras.
A paisagem encanta. os campos verdes, entrecortados por coxilhas, rios e arroios, atrativos de forte apelo. Quem conferir, vai andar a cavalo, junto com o gaúcho fronteiriço, em meio a bois, vacas, e ovelhas, além de saborear um autêntico churrasco gaúcho.
A Festa Internacional do Churrasco, que se realiza em novembro.é a maior churrascada do mundo, numa área de 240 hectares. Durante quatro dias de muitas festanças, é armada, paralelamente, a Festa Campeira.
Arrebanhado os tchê de todas as querências. É feito um buraco no chão e, dos espetos, salta carne em abundância. Isso, junto com muita crioulaça, gineteada, cancha reta, penca de peitiços e mateada, atrações que incluem – e incluirão sempre – um homem e um cavalo. Também tem os passeios em carroça e muita música, cultura e arte gaúcha, além de tango e canto sem fronteira.


Com coxilhas e arroios
Bagé sediou as duas principais revoluções no Rio Grande do Sul, a Farroupilha, entre 1835 a 1845, e a Federalista, em 1893
botando-se o pé no Caminho Farroupilha, a trilha se abre para encontrarmos no tempo com velhos heróis farrapos, entre eles, Bento Gonçalves, Giuseppe Garibaldi, Gomes Jardim e o General Souza Netto, que, em 11 de setembro de 1836, após vencer a Batalha do Seival, na margem esquerda do Rio Jaguarão, proclamou a República Rio-Grandense.
Viajando-se por aquela rota de tantas batalhas do passado, pode-se embrenhar pelas grutas e cavernas que serviram de esconderijos às tropas farroupilhas, conhecer a Charqueada São João cenário para a minisérie global A Casa das Sete Mulheres, que narrou as escaramuças de dez anos entre gaúchos e imperialistas, e atracar no porto de Rio Grande, ponto estratégico dos revolucionários.
Passeios imperdíveis
Se no centro histórico de Bagé pode-se conhecer antigos casarões, sobrados e museus bem preservados, como o de Dom Diogo de Sousa, quase réplica do Palácio de Queluz, em Portugal, outro programa imperdível da região de Bagé é conhecer as estâncias e conversar com os estancieiros. É a hora de vivenciar as lides campeiras e de conhecer um ecossistema único (o pampa) que integra o nosso povo ao Uruguai e à Argentina.
Para o amante do turismo ecológico, a região de Palmas, por onde rola o Rio Camaquã, distante 38 quilômetros do centro de Bagé, é perfeita para trilhas, escaladas e rapel. Ali está o Galpão de Pedra, que abrigou revolucionários federalistas, o misterioso Rincão do Inferno, os Picos do Morcego e do Elefante e a Toca do Sapateiro.
Alguns pontos turísticos urbanos imperdíveis de visitar: Igreja de São Sebastião de Bagé – de 1820, recebeu, em 1885, a visita da Princesa Isabel e do seu marido, o Conde D`Eu. Durante a Revolução Farroupilha, em 1893.

O primeiro contato do município com o homem europeu aconteceu na segunda metade do século XVII, quando os padres jesuítas, após fundarem São Miguel, desceram da região dos Setes Povos das Missões e instalaram-se aqui, fundando a Redução de Santo André dos Guenoas, em 1683. Porém, os índios daqui (que os padres pretendiam catequizar) eram rebeldes em relação aos índios missionários e aos homens brancos e destruíram a redução.

Mais tarde, em 1750, Portugal e Espanha assinaram o Tratado de Madri, pelo qual os portugueses renunciavam à Colônia de Sacramento em troca de terras do atual Rio Grande do Sul e da expulsão dos Setes Povos para a outra margem do Rio Uruguai. Mas quando, em 1752, os dois exércitos – português e espanhol – chegaram nos campos de Santa Tecla para demarcar as fronteiras, foram rechaçados por 600 índios charruas (tribo predominante nesta área), comandados por Sepé Tiarajú, que teria dito que aquelas eram “terras que Deus e São Miguel lhes haviam dado”.

Alguns anos depois, em 1773, o Governador de Buenos Aires, D. Juan José Vertiz y Salcedo, com 5.000 homens, partiu do Prata para expulsar os portugueses do Rio Grande do Sul. Chegando aqui, fundou o Forte de Santa Tecla, do qual ainda existem demarcações. O forte era cercado por um fosso de 9 metros de largura e 2,5 de profundidade, tinha muralha de 3 metros de altura e baluartes que alcançavam 5,5 metros. O Forte foi arrasado duas vezes. A primeira, em 1776, Rafael Pinto Bandeira o invadiu e expulsou os espanhóis, destruindo parte de sua construção.

Depois de assinado o Tratado de Santo Idelfonso, em 1777, uma guarnição espanhola ocupou novamente o Forte, e os portugueses se estabeleceram numa Coxilha que recebeu o nome de São Sebastião – Guarda de São Sebastião.

Em 1801, os espanhóis abandonaram todos os seus postos avançados, inclusive o Forte de Santa Tecla, que foi, pela segunda vez, demolido e arrasado. O território passou definitivamente aos portugueses, e as terras bageenses foram ocupadas por sismeiros ou arrendadas a pessoas que se destacaram nos combates travados.

Em 1810, algumas das colônias espanholas conquistaram sua independência da metrópole, e em meados do ano seguinte, em 1811, o governador do Rio Grande do Sul, Dom Diogo de Souza, concentrou o exército português nas fronteiras, temendo alguma ação dos recém-separados espanhóis. Assim, montou seu acampamento próximo aos “Cerros de Bagé”, local onde hoje está situada nossa cidade. Segundo alguns historiadores, em 17 de julho de 1811, D. Diogo partiu com suas tropas para invadir o Estado Oriental del Uruguay, deixando aqui várias pessoas que não puderam acompanhá-lo e que originaram o município. A data de fundação de Bagé – 17 de julho de 1811 – bastante discutida até hoje, foi estipulada em 1963, por ocasião do Congresso do Segundo Centenário do nascimento de Dom Diogo de Souza.

Quanto à origem do nome Bagé, há várias hipóteses, todas elas ainda discutidas. Há quem diga que no local onde hoje está situada Bagé, viveu um cacique minuano chamado Ibajé. O índio Ibajé estaria enterrado no Cerro de Bagé, e do seu nome teria se originado o nome da nossa cidade. A existência desse índio nunca foi comprovada, sendo mais provável que seja uma lenda. A hipótese mais aceita é aquela que diz que a origem do nome Bagé vem da linguagem indígena, e está relacionada com a idéia de “cerros”. Os índios tapes chamavam os Cerros de “mbaiê”, porém a expressão mais aceita para a origem do nome da cidade é “bag”, outra expressão indígena que também significa “cerros”.

A povoação foi aumentando devagar, espalhando-se ao redor da Praça da Matriz (onde seria o centro do acampamento), e uma igreja, muito simples, foi construída (em 1820) para abrigar a imagem do padroeiro da cidade, São Sebastião, trasladada em 1813 da Guarda da Coxilha para Bagé.

Mesmo após a demarcação definitiva das fronteiras, as terras do município de Bagé continuaram a presenciar guerras e batalhas. Em 1825, D. Carlos de Alvear invadiu o território gaúcho, e no início de 1827, as forças do general Lavalleja entraram em Bagé, saqueando, queimando e destruindo o que encontravam pela frente. No ano seguinte, a assinatura do Tratado de Paz devolveu o sossego à fronteira.

Em 1835 foi a vez dos gaúchos batalharem entre si. A eclosão desta nova disputa deu-se não pelos antigos objetivos de conquista de terras. Agora, os motivos eram outros: estavam em jogo os ideais de republicanos e imperialistas. Bagé, mais uma vez, viu seus campos servirem de palco para diversas batalhas. Uma das mais importantes e lembradas, a “Batalha do Seival” foi travada em 10 de setembro de 1836 nos Campos do Seival. As tropas republicanas, comandadas por Antônio de Souza Netto, saíram vitoriosas e, no dia 11 de setembro, o mesmo General Netto, no atual Campo dos Menezes, margem esquerda do Rio Jaguarão, proclamou a República Rio – Grandense.

Finda a Revolução Farroupilha, Bagé foi elevada à categoria de freguesia, em 18 de maio de 1846, e de vila, em 5 de junho do mesmo ano. Foi reconhecida como cabeça de comarca em 22 de dezembro de 1858 e, quase um ano depois, em 15 de dezembro de 1859, foi elevada à categoria de cidade
Outra revolução eclodiria na Província em 1893, quando os federalistas reagiram à ascensão dos republicanos ao poder. Em 11 de fevereiro, Gumercindo Saraiva invadiu o Rio Grande do Sul pelo Rio Jaguarão e, no Passo do Salsinho, foi travado o primeiro combate. Durante a Revolução de 1893, o município testemunhou ainda o Combate das Traíras, o Cerco do Rio Negro e o Sítio de Bagé. No Rio Negro, 300 prisioneiros foram degolados sem poderem esboçar defesa. O Sítio de Bagé teve como palco a Praça da Matriz e a Catedral, que ficou sitiada quando os revolucionários tentaram tomar a cidade. Foram construídas trincheiras e, sob o comando do Coronel Carlos Telles, os pica-paus (defensores do governo oficial) resistiram à invasão. Como não podiam sair, tiveram que enterrar seus mortos ao lado das torres da Igreja.

Com mais uma Guerra terminada, o início do século XX mostrou-se promissor para a cidade, que reunia várias qualidades capazes de transformá-la num centro industrial e agrícola.

Relatos do início do século contam que o clima de Bagé era bem definido e o solo abundante em riquezas naturais, destacando-se já as minas de carvão de pedra em Candiota e no Rio Negro. Na pecuária, Bagé contava com uma boa produção de carneiros, bois e cavalos. A agricultura, embora a cidade já exportasse trigo desde 1835, encontrava-se um pouco mais atrasada que a pecuária, e os produtos de destaque eram o trigo e o arroz.

A tradição de realizar exposições-feiras parece bem antiga. há relatos de uma, ocorrida no princípio do século, no então Hipódromo Vinte de Setembro, adaptado para receber gado de leite, de corte e eqüinos. A seção agrícola teve mostras de trigo, cereais e frutas, destacando-se os vinhos feitos com vários tipos de uvas plantadas na região, todas de primeira qualidade. Houve também a seção industrial, com produtos de arte gráfica e livros.

Bagé contava com um progresso urbano considerável, estando inclusive favorecida com relação a outras cidades. A estrada de ferro já havia sido inaugurada no século anterior, em 1884, com a conclusão do trecho Bagé – Rio Grande, assim como a luz elétrica, inaugurada em 1899. Bagé foi a primeira cidade do Rio Grande do Sul e a terceira do Brasil (atrás de Campos – RJ e Juiz de Fora – MG) a ter energia elétrica, mostrando o progresso da cidade. No início do século, a cidade já contava com bens e serviços de higiene pública e rede telefônica. Os serviços de abastecimento de água encanada e potável e esgotos demoraram um pouco a sair do papel, mas mesmo assim, em 1913 entrou em funcionamento a Hidráulica Municipal. As estradas também eram boas.

Em Bagé, por essa época, já se encontravam bancos (como o Pelotense e o de Emílio Guilayn), clubes (como o Caixeral e o Comercial), e hotéis. O Hotel do Comércio talvez seja um dos melhores exemplos do poder da cidade na época: inaugurado em 1842 por um francês, foi sofrendo reformas e melhorias até tornar-se um dos melhores hotéis do Estado, extremamente luxuoso e referência para outros estabelecimentos.

A vida social da cidade era muito animada, sendo famosas as festas e “recepções” onde se destacavam já as mulheres rio grandenses e sua beleza. Mas as “festas” preferidas da população, principalmente entre os de maior poder aquisitivo, eram as corridas de cavalos. Já no começo do século o município era conhecido pelas qualidades dos belíssimos eqüinos aqui criados.

O comércio era bastante variado e movimentado, e vários produtos importados diretamente dos principais países europeus, como França, Itália, etc., podiam ser encontrados com facilidade.

Outros destaques da Bagé do início do século eram a qualidade do ensino oferecido e a bonita arquitetura urbana, com influência predominantemente portuguesa, destacando-se os palacetes e sobrados. As ruas eram bem calçadas e arborizadas.

As famosas charqueadas, muito presentes nesta parte do Estado na época, também tinham destaque. Elas movimentavam a economia local e estadual. A prova da importância das charqueadas para Bagé é que eram estas quem mais empregavam pessoas no começo do século.

Devido à importância da cidade para a região, ganhou o apelido de “Rainha da Fronteira”. Já formou renomeados artistas plásticos e ofereceu ao Brasil importantes nomes das mais variadas áreas, desde o lateral-esquerdo da seleção Branco até o ex-presidente Emílio G. Médici. Sedia a Universidade da Região da Campanha – URCAMP, possui um instituto musical ativo, além de outras manifestações culturais. Mantém vivas as tradições do gaúcho e oferece a seus cidadãos e visitantes a possibilidade de admirar prédios históricos, participar de atividades culturais, conviver com hábitos típicos da região e muito mais.

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